Acho que essa repulsa à extensão da igualdade aos animais é parecida com a repulsa que até hoje tem-se, por exemplo, quando se fala em igualdade para os gêneros.
Falavam que as mulheres feministas renegavam feminilidade, deviam é ser mulher, estavam querendo ser homens...mas ora o que era ser homem? Era ser livre, poder pensar, ter autonomia, participar, ter cidadania, direito sobre seu corpo, sexualidade....uma mulher com essas coisas era considerada uma mulher masculinizada. Até hoje persiste isso de
forma sublimada.
A igualdade aos animais parece até palhaçada quando falo isso, as pessoas ficam assustadas, acham fanatismo...me acham uma excêntrica, enfim. Mas é parecido com o que as mulheres passaram. Hoje se condena e se pensa: como pudemos ter feito isso no passado? Uma
novela como Sinha Moça serve pra endossar esse pensamento de que hoje somos mais
civilizados que antigamente, a midia cria um ilusionismo através do contraste exagerado: olhem que cruel! Mas as pessoas se tornam incapazes de perceber as sutilezas das opressões do tempo presente.
Será que no futuro vai haver uma novela que mostre o sofrimento e a luta pela liberdade dos bichos? Será que as escolas vão um dia ensinar às crianças a respeitarem todas criaturas? Que mundo teríamos hein? A verdade é que a gente só pensa na gente, no nosso grande e feio umbigo humano.
Um cara escreveu algo assim pra mim uma vez: por que Peter Singer defende aborto e eutanasia e é contra o abate dos animais?
Eis o problema. Aborto é algo mal, mas pensado por uma mente androcêntrica. Que tal perguntar às mulheres se queremos o aborto? Por que não perguntar ao animal se ele quer ser alimento? O egocentrismo permeia tudo.
Pensa-se logo na criança (ou feto...)...nunca na mulher. A criança sempre foi propriedade dos homens, assim como o corpo da mulher o foi, hoje o corpo da mulher é propriedade de um estado, é decidido por um parlamento, com uma bancada evangélica forte (bando de escrotos mentirosos, bandidos), e é também decidido pela opinião do vaticano, local onde as mulheres são "inexistentes" e "inaptas" ao exercício dos cargos religiosos justamente pra não formarem uma
opinião feminina que contradiga os dogmas dessa igreja patriarcal.
Nunca se pergunta se o negro quer as cotas ou não. Nunca se pergunta se as mulheres querem isso ou aquilo. Aliás numa sociedade em que as mulheres não são educadas para serem elas mesmas, com sua opinião, sua decisão, e autoconfiantes, quem pensa por ela é toda uma
tradição e mesmo elas dizem que são contra o aborto, até vivenciarem o quanto isso é mais complexo do que se imagina (e nunca imaginariam os homens centrados demais no seu umbigo, e com horror de se pôr na pele desprezível de uma mulher como fazem os "bichas" e "travecos"
que tanto despreza).
Não se engravida por irresponsabilidade. Se engravida por não ter informação, por não ter conhecimento do próprio corpo(numa sociedade em que o corpo da mulher pode até ser hiperexposto para o bem dos homens, mas é ocultado e proibido para elas próprias), por hesitar
em assumir uma postura de curiosidade e condução da sua vida sexual (quando as mulheres tem que ter vergonha de gostar de fazer sexo, afinal me digam que orgulho pode ter uma mulher de dizer: gosto de dar? Não ficariam mais à vontade elas se pudessem dizer: gosto de
comer?), por não serem estimuladas, por não terem acesso a ginecologista e plano de saude, conduzindo os anticoncepcionais de forma errada, por ter a cabeça cheia de mitos, porque os caras não tão nem aí pra desfazer esses mitos já que a consequência não é pra
ele (privilegiados que são por aqui), porque as mulheres não são criadas pra serem autoconfiantes o suficiente pra decidir como e o que elas querem quanto a sexualidade, ou por acidente! Ginecologista indicou errado, o farmacêutico orientou errado, a pessoa se enganou
quanto à administração, acidentes gastrointestinais, uma massagem no gluteo onde foi dada a injeção...várias coisas! As mulheres não podem errar? Errar é humano, errar é feminino também ou não?
Mas nãão!, o mais importante é a mulher ser penalizada pelo seu mal de ser mulher, de ter pecado, de ter pisado na bola, porque a culpa é toda dela!!!
E a guria pobre, sem condições de criar um filho, engravidou por motivos diversos, vai levar adiante a gravidez por respeito à moralidade?
A garota vai decidir por um aborto, vai abordar clandestinamente porque o aborto é ilegal (a ilegalidade o torna, então, extremamente insalubre) e como é caríssimo também, acaba abortando na vizinha e em seguida morre por complicações ginecológicas. O aborto é uma das maiores causas de mortalidade feminina (junto com violência doméstica e assassinato passional, ou melhor, possessivo...)...a vida da mulher é tão desprezível assim? Mais do que de um aglomerado de células?
E o direito à vida das mulheres, como fica?
Pra quem sobrevive fica as condenações como esterelidade e culpa. Aquelas que abortam já passaram por experiência desamparadora, ainda por cima tem que sofrer pela culpa e imcompreensão? Pela condenação de toda sociedade? Pela condenação de si mesma?
Direito à vida significa direito de autogestão da própria vida pra mim. O que o ser humano faz de mal às outras espécies é principalmente sua intervenção nociva. Se o leão come os filhotes da
leoa pra poder cruzar com ela e ter a "sua" ninhada com ela, cabe a nós julgar, qualificar, condenar? Acho que não cabe a ninguém também querer ser diretivista com a vida dos outros, causando-lhe o mal. Nem com a vida das outras pessoas humanas, nem com a vida das pessoas não-humanas.
terça-feira, janeiro 09, 2007
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